quarta-feira, 29 de abril de 2020

Sozinho e mal acompanhado


Quantas vezes nos sentimos sozinhos mesmo rodeados de pessoas? Acho que tantas quantas nos sentimos totalmente preenchidos quando estamos em plena solidão. Particularmente prefiro a companhia de pessoas, sou daqueles que funciona a base de gente, quando sozinho minha máquina começa a parar. Engraçado é eu estar contando isso justamente numa época em que estou morando sozinho, tendo que encontrar em duas amigas caninas todo o conforto que me tira da completa solidão noturna. E falando em estar sozinho...
Era para ser uma viagem daquelas, não tinha o que dar errado, local sensacional - rota 66 nos Estados Unidos - pessoas legais e ainda andando de moto pela primeira vez fora do Brasil. Primeira parada, Los Angeles. Era meio da tarde quando desembarcamos e fomos para nosso hotel muito bem localizado em plena Hollywood Blv, ao lado do Teatro Chinês. Assim que fizemos check-in já saímos para explorar toda a região, a pé mesmo, curtindo toda aquela atmosfera que só LA (sem trocadilhos) pode oferecer.
Acordamos no dia seguinte ainda extasiados por tudo aquilo, o roteiro do dia seria conhecer Santa Monica e seus arredores, fomos. Logo na saída do estacionamento encontramos uma loja de locação de bikes, onde logo veio a ideia de alugar para conhecer melhor a orla. Como eu tenho uma sequela de um acidente que sofri anos atrás, fiquei com receio de alugar sem antes tentar pedalar (nunca mais havia feito isso), então fiz a proposta para o líder da viagem:
- Vamos fazer o seguinte, você aluga sua bike enquanto eu te espero no pier, aí chegando lá eu dou uma volta e vejo se consigo ainda pedalar normalmente, se conseguir eu corro até a loja e alugo uma para mim?
Trato Feito (sem trocadilhos 2)
Larguei eles na loja e me postei no banco da praça, conforme combinado. Alguns minutos depois lá vem a gang ciclista, param na minha frente e o líder solta:
- Vamos só até o final do pier e já voltamos ok, aí você testa se consegue andar, beleza?
Claro que concordei, eu sei quando estou inconveniente e isso era o mínimo que podia fazer por atrasá-los em seu passeio, sentei novamente, lá foram eles até o pequena jornada inicial.
"Quanto tempo será que leva para ir até o final do Pier e voltar? pensei eu, assim que se passaram os primeiros 15 minutos. Esperei."
"Acho que vou andando até o final do Pier para encontrar com eles, devem estar parando de loja em loja, aí já pego uma bike e faço o teste, pensei eu, assim que se passaram os primeiros 30 minutos. Fui."
Para minha surpresa e espanto, nada de bikers, nada de bikes e já estava achando que, nada de "amigos" também. Fui e voltei naquele Pier mais duas vezes, andei ao redor, sempre preocupado em voltar ao banco que era nosso ponto de encontro. Lá pelas duas da tarde, algo perto de duas horas da última vez que os tinha visto, resolvi andar por conta, fui almoçar, fui no shopping, mas, sempre retornando ao banco da praça com uma pitada de esperança de ainda encontra-los. Entre essas idas e vindas eu regularmente passava também pelo estacionamento, sempre vendo que a nossa van ainda estava estacionada, essa imagem me dava um certo alívio até porque - não mencionei antes - era minha primeira vez em Los Angeles, não conhecia ninguém lá, e não tinha ideia do nome do hotel ou tampouco seu endereço, a contar também que meu inglês macarrônico compete com os dos recém-chegados taxistas ucranianos.
Confesso que a decepção aliada a raiva crescente tomava conta de mim, tentava achar respostas e motivos sem cansar, mas nada me vinha à cabeça. Sentimento esse que cresceu exponencialmente quando, na última passada pelo estacionamento, só encontrei uma vaga, sem van. definitivamente tinham me deixado para trás. Motivo, desconhecido.
Resolvi relaxar em um bar que encontrei no terraço do shopping e que servia um bom vinho e oferecia uma bela vista do mar e seu pôr do sol. Sozinho aportei por lá e fiquei tentando pensar o que fazer. Meu problema já não era só aquele, não bastava eu conseguir voltar para o hotel, mas como seria nosso relacionamento dali pra frente, lembrando que esse era só o primeiro dia da viagem.
Quando anoiteceu, a beleza do pôr do sol já não fazia companhia, o vinho já se mostrava presente junto com o frio do final do inverno, era hora de ir. andei até um ponto de taxi que havia cruzado nas andanças e entrei em um.
Um aparte, como é estranho você sentar no banco de trás do carro e ter uma blindagem entre você e o motorista, tem que falar por buracos e pagar através de um escaninho.
Bem, pedi para ir até o tal teatro chinês, aquilo era minha única referência que tinha, ainda tentava caçar sinal "free wi-fi" durante a viagem para ir atualizando o GPS do celular, para ver se estava indo no caminho certo ou se iria virar estatística de mais um maluco gringo. Quando comecei a ver lugares conhecidos foi um alívio, vira aqui, vira ali, cheguei no hotel, sorte que meu senso de direção estava afiado.
Na recepção me informaram que ninguém do meu grupo havia chegado ainda, no quarto vazio tomei banho, me troquei e já estava pronto para continuar minha jornada solitária pela cidade quando eles chegaram, todos alegres e sorridentes, afinal passaram um dia maravilhoso, soube que após o passeio de bike ainda pegaram o carro e foram na Rodeo Drive, Beverly Hills, entre outras coisas. Imediatamente meu sangue subiu ao ver aquele povo festejando e parti para cima do amigão que havia feito o trato comigo, aos berros iniciei meu dicionário de xingamentos, ele ainda tentou retrucar, mas a razão estava toda comigo, fiquei ali sabendo que o resto do grupo não sabia de nada, ele havia dito que eu não queria fazer o passeio com eles.
No dia seguinte começou a viagem de moto, verdade que isso me alegrou um pouco mas estava bem chateado com todos ali do grupo, até porque esse vaso quebrado não dava mais cola, como não deu. O "amigão" eu vi pela última vez no desembarque no aeroporto em SP. Mas uma coisa aconteceu de positivo nisso tudo, nasceu ali a vontade de organizar viagens de moto com amigos de verdade. Assim que voltei já comecei a planejar a próxima trip, toda essa confusão fez nascer os “Brazucas” e a “Uritur”, obrigado "amigão".

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