Era maio de 1976, acabara de completar oito anos, o presente que fazia
parte da lista de desejos de toda criança foi anunciado, vamos à Disney. Ah,
como os dias ficaram longos, as férias de julho pareciam cada vez mais
distantes, sonhando acordado e de mala pronta esperei, quanto mais próximo
chegava da data de embarque, mais difícil era pegar no sono, a expectativa era
enorme, acredito que normal dentro das circunstâncias. Quatro de Julho,
desembarcamos em Miami, onde seria a primeira fase da viagem, tudo estava uma
confusão, era somente o centenário da independência americana e como os caras
são ultranacionalistas, até os hambúrgueres eram servidos com uma bandeira
fincada no pão.
O hotel era em formato de “U”, no vão interno havia um chafariz grande
e muito performático, do corredor de acesso aos apartamentos era possível
avistar por cima a dança das águas. Na abertura do “U” se dava o acesso à área
de lazer, onde piscinas, quadras, restaurantes e o mar poderiam ser saboreados
e utilizados, um bom hotel, tudo muito arrumado e de organização impecável,
belo.
No quarto, duas camas de solteiro seriam nossas “descansa ossos”, o
dividiríamos durante essa etapa da viagem, o banheiro era posicionado ao lado
esquerdo da porta de entrada. Malas sendo abertas, uma arrumação básica, troca
de roupas, estava sedento por estrear toda a estrutura recreativa, de saída,
fui chamado para uma “reunião introdutória”, do tipo isso pode, isso não pode,
se acontecer isso faça aquilo, e assim vai, neste momento também fui agraciado
com uma boa parte do dinheiro trazido e fui instruído, isso é para toda a
viagem – seriam 30 dias – acabou, acabou, então cuide bem. Novamente, para quem
já vendeu limões... peguei uma pequena parte, guardei o resto e fui.
A lembrança que tenho da piscina é de gigantismo, certo que essa
impressão se dera pelo meu tamanho, ou ambos. Vestia um short modelito anos 70,
no pé um “Adidas” de couro branco com as famosas três listras, uma camiseta
vinho claro e vinho escuro alternadas em faixas verticais. Cinco minutos se
passaram e havia feito a primeira amizade, um garoto de mesma faixa etária,
americano, que tinha o mesmo interesse em mímica, pois era nosso método de
comunicação, no que ficamos especialistas, pois, ao final do dia quando
retornei ao quarto, estava calçando um “All Star” azul escuro, que havia
trocado no pau a pau com o moleque. Esse tênis era um sonho de consumo, nessa
época só entravam no Brasil por meio dos ilícitos vendedores de contrabando, ou
através de algum parente que fosse visitar o tio Sam, aquele era o primeiro da
minha vida, ainda teve um gosto de negócio bem feito, perfeito, uma parte do
dinheiro destinado a essa compra já estava economizado. Primeiro dia terminara,
estava realizado, aquela viagem seria promissora.
Passeamos pela cidade, voltamos final de tarde, àquela época não
tínhamos o hábito do horário de verão, portanto demorou a acostumar com a
claridade até as nove ou dez horas, o combinado seria um breve descanso, um
banho e sair para jantar. Fui o primeiro a me aprontar, mamy ainda estava no
banho quando resolvi sair do quarto e apreciar o chafariz, deixei a porta
aberta e fiquei olhando do alto do décimo segundo andar, a vista mostrava não
só o esguichar das águas, mas também os que adentravam no hotel e também em
seus quartos. Fiquei parado por alguns minutos, me virei e fui em direção ao
quarto, a inquietude se manifestara, ao lado da porta, numa altura de mais ou
menos 30 cm do chão, havia uma pequena caixinha, de cor bege clara – combinando
com a decoração do local – fechada e com uns dizeres em preto, abaixei, olhei,
tentei decifrar, abri.
Um som muito alto, estridente e intermitente soou imediatamente após a
“defloragem” da caixinha, teria sido o causador daquele transtorno? não iria
ficar ali parado e me denunciar, entrei no quarto, no momento que estava
fechando a porta mamy saiu do banheiro, ainda de toalhas enroladas ao corpo e
gritando sobre o alarme de incêndio, que precisávamos sair apressadamente.
Pensei sobre as consequências e agi rápido, me denunciei contando o fato
ocorrido, quando esperava a mega bronca, ela, pensou sobre as consequências e
agiu rápido, vamos sair correndo, se somente nós ficássemos no quarto ou
saíssemos sem pressa, essa atitude nos denunciaria, se vestiu rápido, corremos.
Descer as escadas foi cansativo e, apesar da
alta densidade, as pessoas estavam bem calmas e ordenadas, primeiro mundo até
na hora do desespero. Chegamos ao saguão principal junto das primeiras unidades
dos bombeiros, que “chegam chegando”, carregando machados, mangueiras, maletas
e tubos de oxigênio, vão vasculhando tudo. A confusão era generalizada, pessoas
gritando, os brazucas da excursão reclamavam sobre seus pertences abandonados
nos aposentos, falando sobre a má sorte logo na segunda noite, mamy se juntava
às conversas, contudo sabia que a sua principal preocupação era outra. Duas
horas do acontecido e fomos liberados para voltarmos à vida normal, foi
detectado um alarme falso, como sou muito sortudo, a tecnologia ainda não
detectava a origem do mal. Voltamos ao quarto, agora com os elevadores
liberados, e combinamos que este assunto seria de divulgação proibida, acordo
feito.
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